Estado não deve pagar indenizações por falas de parlamentares, diz STF
29.09.2025 – Servidor Público

O Plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu nesta sexta (26/9), por unanimidade, que o Estado não pode ser responsabilizado por declarações protegidas pela imunidade parlamentar — ou seja, que os governos estão livres de pagar qualquer indenização por opiniões, palavras ou votos dos legisladores.
A decisão foi tomada em sessão virtual. O caso tem repercussão geral, ou seja, a tese estabelecida servirá para casos semelhantes nas demais instâncias da Justiça.
Contexto
A Constituição garante imunidade civil e penal aos parlamentares “por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos”. Por outro lado, atribui ao Estado a responsabilidade civil objetiva por eventuais danos causados por seus agentes no exercício de suas funções.
O caso tem origem em uma sessão da Assembleia Legislativa do Ceará ocorrida em 2000. Na ocasião, um juiz disse ter sido ofendido por um então deputado estadual e, por isso, processou o estado.
Ao analisar o caso, o juízo de primeiro grau condenou o estado do Ceará a pagar ao autor uma indenização por danos morais equivalente a 50 vezes a remuneração mensal do magistrado, o que significava mais de R$ 1 milhão. O Tribunal de Justiça estadual manteve a condenação, mas reduziu o valor para R$ 200 mil.
No recurso ao Supremo, o Executivo cearense argumentou que não poderia ser condenado porque o parlamentar tem imunidade pelo que diz no exercício de seu mandato. O governo estadual reconheceu que a imunidade não é absoluta, mas defendeu que, se houver excesso, a responsabilidade deve ser do parlamentar, e não do ente federado.
Voto do relator
Relator do processo, o ministro Luís Roberto Barroso defendeu que a imunidade parlamentar afasta a responsabilidade do Estado. Além disso, acrescentou o ministro, o próprio parlamentar deve ser responsabilizado caso extrapole os limites de sua imunidade.
Os demais magistrados acompanharam o relator. O ministro André Mendonça, porém, fez ressalvas ao votar.
Barroso explicou que a imunidade parlamentar não é um privilégio individual, mas sim uma prerrogativa vinculada à função pública — ou seja, ela “pertence” ao Estado. Assim, não seria coerente excluir a responsabilidade apenas da pessoa do parlamentar.
O magistrado também apontou que a “ameaça de condenação” do Estado por danos causados a terceiros causaria um “indesejável efeito de censura ou de inibição sobre o debate público”. Isso porque os discursos parlamentares seriam mais contidos, sem críticas duras, denúncias ou fiscalização do poder.
Além disso, prosseguiu Barroso, adversários políticos poderiam usar a “ameaça de judicialização do discurso” contra o Estado como forma de intimidação.
“Converter a fala parlamentar imune em passivo financeiro do Estado fragilizaria a separação de poderes e a autonomia do Legislativo, abrindo uma via de interferência indireta sobre a liberdade de expressão parlamentar”, disse ele.
Barroso destacou, ainda, que se cada manifestação de um parlamentar pudesse ser convertida em uma indenização a ser paga pelo Estado, as maiorias teriam incentivos para silenciar discursos minoritários no Legislativo, com o argumento de evitar custos financeiros.
“Em vez de garantir a circulação de ideias minoritárias (muitas vezes essenciais à fiscalização e ao avanço de direitos), o sistema passaria a homogeneizar o debate por constrangimento fiscal indireto”, afirmou.
Por fim, o relator lembrou que a Constituição garante ao Estado o direito de regresso contra o responsável pelos danos. Ou seja, se o governo for responsabilizado pela conduta de algum agente público, pode cobrar reparação dessa pessoa.
Mas o Estado não teria essa opção nos casos de discursos de parlamentares, que estão protegidos pela imunidade. Assim, a regra constitucional não teria efeito e seria distorcida.
Voto-vogal
Ao acompanhar o entendimento do relator, o ministro André Mendonça reforçou a tese de que a eventual responsabilização de parlamentares que extrapolarem os limites de sua imunidade deve recair “de forma direta e exclusiva sobre o próprio ofensor”. Ele observou, contudo, que a análise da controvérsia não impôs limites à imunidade parlamentar.
Fonte: Consultor Jurídico – 28.09.2025