ISS fixo incide sobre sociedade uniprofissional limitada, decide STJ
10.10.2025 – Servidor Público

A 1ª seção do STJ fixou, no tema 1.323, tese no sentido de que a adoção da forma societária de responsabilidade limitada não impede, por si só, o enquadramento de sociedades uniprofissionais no regime diferenciado de tributação do ISS, previsto em alíquota fixa pelo art. 9º, §§ 1º e 3º, do decreto-lei 406/68.
Entenda
A controvérsia teve origem em lei municipal de São Paulo que impedia o enquadramento de sociedades constituídas sob a forma limitada no regime de ISS com alíquota fixa.
A norma considerava que, ao adotar a forma de responsabilidade limitada, essas sociedades deixavam de ter caráter pessoal e passavam a ser empresariais, o que as tornaria incompatíveis com o benefício fiscal.
Com isso, a Prefeitura passou a cobrar o imposto com base no faturamento, afastando o regime diferenciado destinado aos profissionais que atuam pessoal e diretamente em suas atividades.
Sustentações orais
Em sessão nesta quarta-feira, 8, o advogado Eduardo Henrique Vasconcelos Andrade defendeu que sociedades limitadas de profissionais liberais devem usufruir do regime diferenciado do ISS com alíquota fixa.
Segundo o advogado, a forma societária não é o elemento definidor para o enquadramento no regime fixo, pois o que importa é o exercício pessoal da atividade e a responsabilidade ilimitada dos sócios quanto aos serviços prestados.
Assim, argumentou que o fato de a sociedade adotar a forma limitada não descaracteriza sua natureza pessoal, desde que haja atuação direta dos profissionais habilitados.
Nesse sentido, citou que o STF no tema 918 já decidiu ser inconstitucional lei municipal que cria impedimentos ao regime fixo de tributação para sociedades de profissionais, decisão que, segundo ele, se aplica por analogia ao caso.
Mencionou ainda precedentes do STJ que reconheceram não haver relevância na espécie empresarial adotada para fins de concessão do regime de tributação fixa do ISS.
Por fim, pediu o reconhecimento do direito da Clínica TF de São Paulo de recolher o ISS de forma fixa, afastando as restrições impostas pelo município.
Já o procurador Paulo André Moreira de Souza, representando o município de São Paulo, defendeu a interpretação restritiva do benefício fiscal, argumentando que o regime diferenciado não deve ser aplicado às sociedades limitadas.
Ele sustentou que o dispositivo foi criado para proteger profissionais liberais que exerciam pessoalmente suas atividades e respondiam ilimitadamente pelos riscos do ofício, como médicos, advogados e engenheiros, no contexto histórico anterior ao atual CC.
Assim, conforme afirmou, tratava-se de uma norma de Justiça tributária, e não de vantagem econômica, já que reconhecia o risco pessoal assumido por esses profissionais, justificando o tratamento fiscal simplificado.
Segundo o procurador, a realidade jurídica das sociedades limitadas é radicalmente distinta, pois nelas o risco da atividade não recai mais sobre o profissional, mas sobre a pessoa jurídica, rompendo o fundamento que justificava o benefício.
Assim, afirmou que, ao limitar a responsabilidade patrimonial, essas sociedades já usufruem de um benefício empresarial conferido pelo CC, e acumular esse privilégio com o benefício fiscal configuraria dupla vantagem indevida, em violação ao princípio da isonomia tributária.
Paulo André destacou ainda que, embora o sócio mantenha responsabilidade técnica perante os conselhos profissionais, essa é de natureza ética, e não patrimonial, o que afasta o pressuposto exigido pela norma para concessão do regime fixo.
Ressaltou também que a interpretação ampliativa proposta pela parte contrária transformaria um benefício pessoal em benefício societário, abrindo espaço para que grandes clínicas e escritórios empresariais passem a recolher ISS com base fixa, o que distorceria o conceito de sociedade uniprofissional.
Por fim, defendeu que o ônus da prova quanto ao preenchimento dos requisitos do regime diferenciado cabe ao contribuinte, conforme o art. 150, §6º, da CF e o art. 111 do CTN, e concluiu pleiteando a fixação de tese restritiva sobre a aplicação do benefício fiscal do ISS fixo às sociedades limitadas.
Voto do relator
Em voto, o relator, ministro Afrânio Vilela, destacou que, inicialmente, o entendimento do colegiado era pela impossibilidade de sociedades limitadas usufruírem o regime privilegiado de tributação do ISS.
No entanto, segundo o ministro, o entendimento evoluiu de forma significativa para que o STJ compreendesse que, para o tratamento privilegiado previsto nesses dispositivos, seria irrelevante a adoção da forma societária limitada.
Para S. Exa. o ponto central do benefício é “a prestação do serviço especializado com responsabilidade pessoal dos sócios e sem caráter empresarial”.
Nesse sentido, destacou que a jurisprudência da Corte consolidou que o direito à tributação privilegiada depende da atividade efetivamente exercida pela sociedade, devendo ser verificado se ela se enquadra entre as previstas no §3º do art. 9º do decreto-lei.
Também ressaltou que deve ser analisado se a atividade intelectual não possui caráter empresarial, nos termos do art. 966 do CC, ou seja, se a atuação profissional dos sócios não é sobreposta por uma estrutura de produção ou organização típica de empresa.
Diante disso, votou pela fixação da seguinte tese:
“A adoção da forma societária de responsabilidade limitada pela sociedade uniprofissional não constitui, por si só, impedimento ao regime de tributação diferenciada do ISS por alíquota fixa, nos termos do art. 9º, §§ 1º e 3º do decreto-lei 406/68, desde que observados cumulativamente os seguintes requisitos:
I – prestação pessoal dos serviços pelos sócios;
II – assunção de responsabilidade técnica individual; e
III – inexistência de estrutura empresarial que descaracterize o caráter personalíssimo da atividade.”
Caso concreto
Aplicando a tese ao caso, o relator concluiu que a sociedade recorrente não atendia aos requisitos cumulativos, pois as instâncias ordinárias haviam reconhecido a existência de caráter empresarial em sua estrutura.
Assim, negou provimento ao recurso da contribuinte, mantendo a cobrança do ISS pelo regime comum.
O entendimento foi acompanhado por unanimidade pelo colegiado.
Fonte: Migalhas – 08.10.2025