STF analisa FGTS de estatutário; Gilmar quer admitir primeiro IAC da Corte
19.05.2025 – Servidor Público

Está em curso no STF o julgamento da Rcl 73.295, que discute se a Justiça do Trabalho tem competência para julgar ações de servidores públicos estatutários que pleiteiam verbas trabalhistas, como o FGTS, com base na alegação de nulidade da transmudação de regime celetista para estatutário. O julgamento ocorre no plenário virtual da Corte, e já há divergência entre os ministros.
A controvérsia teve origem em ação ajuizada por uma servidora da Funasa – Fundação Nacional de Saúde, contratada como celetista antes da Constituição de 1988 e automaticamente transposta para o regime estatutário com a promulgação da lei 8.112/90.
A autora da ação alega que a transmudação foi inconstitucional, por ter ocorrido sem concurso público, e pleiteia o pagamento de FGTS referente a todo o período. A Justiça do Trabalho acolheu a tese, reconhecendo que a servidora nunca teria deixado o regime celetista. Diante disso, a Funasa levou o caso ao STF por meio de reclamação constitucional.
O relator do caso, ministro Gilmar Mendes, propôs a instauração de um IAC – Incidente de Assunção de Competência no STF para que o plenário fixe uma tese vinculante sobre a controvérsia.
Em voto extenso, o ministro destacou que a matéria é de alta relevância jurídica e social, com divergência interna na Corte, e que o uso do IAC é adequado quando se trata de processos de competência originária, como o caso analisado.
Para o relator, é admissível a instauração do IAC no STF, desde que se trate de processo de competência originária ou recursal ordinária, como é o caso das reclamações constitucionais. No entanto, esse incidente não se aplica a processos submetidos por via de recurso extraordinário, pois isso geraria sobreposição indevida com a sistemática da repercussão geral.
Segundo Gilmar Mendes, o IAC deve ser admitido no STF em situações que envolvam:
Questões predominantemente jurídicas;
Interesse público e repercussão social;
Potencial de divergência jurisprudencial entre os ministros da Corte.
O relator destacou que, embora o CPC seja de 2015, o STF ainda não se debruçou profundamente sobre a aplicação do IAC, tornando esse caso uma oportunidade de estabelecer precedentes.
Em seu voto, o relator propôs ainda a suspensão nacional de todos os processos em tramitação que tratem do mesmo tema, até decisão definitiva do Supremo. A ideia é evitar decisões conflitantes em ações que envolvam milhares de servidores públicos em situação semelhante à da autora da ação trabalhista contra a Funasa.
Ele também determinou comunicação formal aos tribunais do trabalho (TST e TRTs) para que orientem seus juízes sobre a suspensão, e intimação da PGR para manifestação formal.
Veja o voto de Gilmar Mendes.
Voto divergente
Inaugurando a divergência, ministro Edson Fachin discordou da admissão do IAC no STF. Fachin argumentou que o regimento interno da Corte já prevê instrumentos próprios e adequados para resolver divergências internas e tratar de questões relevantes, como o envio direto de feitos ao plenário por decisão do relator.
Para o ministro, o uso do IAC – previsto no art. 947 do CPC – não se aplica ao STF, pois o Tribunal possui uma estrutura processual própria, recepcionada com status de lei ordinária especial.
Fachin enfatizou que o uso do IAC, embora válido em outros tribunais, não deve ser estendido ao STF, sob pena de criar insegurança procedimental e confusão normativa.
“Havendo lei ordinária especial que disciplina de forma exauriente o procedimento a ser adotado quando presente questão jurídica relevante e para prevenir e solver divergência entre as turmas, pedindo respeitosa vênia aos que sustentam posição diversa, voto no sentido de reconhecer, na hipótese, a inconformidade no manejo do Incidente de Assunção de Competência no âmbito deste Supremo Tribunal Federal.”
O ministro ressaltou que o RISTF permite, por meio dos artigos 11 e 22, a afetação de casos ao plenário quando há divergência entre as turmas, e que tais dispositivos já atendem ao objetivo que se pretende alcançar com o IAC.
Veja o voto de Edson Fachin.
Precedente
Caso o STF acolha o entendimento de Gilmar Mendes, haverá uma padronização nacional das decisões, impactando centenas de ações em curso – especialmente contra a Funasa, que identificou mais de 15 mil servidores em situação semelhante.
A deliberação em plenário virtual continua até o dia 23 de maio. A depender da maioria formada, o julgamento poderá estabelecer um novo precedente vinculante com repercussões relevantes para o funcionalismo público e para o próprio desenho institucional da Justiça brasileira.
Fonte: Migalhas – 19.05.2025