TSE volta a debater critério das ‘palavras mágicas’ para propaganda antecipada
21.03.2025 – Licitação e Contrato

O critério para a fixação das chamadas “palavras mágicas” que permitem a configuração da propaganda eleitoral antecipada está de novo em debate no Tribunal Superior Eleitoral.
O tema foi levantado em voto do ministro Antonio Carlos Ferreira no julgamento de Júlio Nascimento Júnior (União), eleito prefeito de São Cristóvão (SE) nas eleições de 2024.
Ele concorreu nas urnas com o nome de Júlio de Marcos Santana, em referência ao prefeito Marcos Santana (MDB), que cumpriu dois mandatos de 2017 a 2024.
A representação por propaganda antecipada se baseou em postagens feitas por Júlio na fase de pré-campanha em que ele aparecia ligado ou exaltando o trabalho de Marcos Santana.
Elas vinham com mensagens como “+ Trabalho Vindo Aí” e a apresentação de reportagens em que Júlio prometia “continuar trabalhando para garantir as conquistas da população obtidas no governo de Marcos e implementar novas ideias e projetos”.
Para o Tribunal Regional Eleitoral de Sergipe, a propaganda ilícita ficou configurada porque as postagens tinham claro viés eleitoral, com menção expressa às eleições de 2024 e utilizando a gestão como meio de gerar o convencimento do eleitor para o voto em sua coligação. Seria, de
O prefeito recorreu ao TSE. Relator do recurso, o ministro Floriano de Azevedo Marques votou por manter a multa de R$ 5 mil, com base em óbices processuais. Para derrubar a condenação, a corte precisaria reanalisar fatos e provas, medida vedada.
Abriu a divergência o ministro Antonio Carlos Ferreira, para quem a qualificação da propaganda antecipada pelo TRE-SE extrapolou as possibilidades apresentadas pela lei. O julgamento foi interrompido por pedido de vista da ministra Cármen Lúcia.
Palavras mágicas ou não
O tema é mais do que conhecido no TSE e parte da previsão do artigo 36-A da Lei das Eleições (Lei 9.504/1996), que lista atos que não configuram propaganda antecipada, como participação em eventos, entrevistas e postagens divulgando posicionamentos pessoais.
O parágrafo 2º ainda acrescenta que “são permitidos o pedido de apoio político e a divulgação da pré-candidatura, das ações políticas desenvolvidas e das que se pretende desenvolver”.
Isso “desde que não envolvam pedido explícito de voto”. A ressalva feita no caput (cabeça) do artigo 36-A levou a adoção do critério das “palavras mágicas”: é preciso que o ato contenha determinados termos, como “votem”, “apoiem” ou “elejam”.
A ideia era que o pedido fosse formulado de maneira clara e direta. Não bastaria o sugerido, o denotado, o pressuposto, o indireto, o latente, o sinuoso ou o subentendido.
Em 2022, porém, o TSE abandonou esse critério, substituindo-o pelo “conjunto da obra”: se o contexto, os atos e as palavras ditas no período vedado deixam claro que se trata de propaganda eleitoral, então a multa será devida.
Como mostrou a revista eletrônica Consultor Jurídico, o TSE deixou essa análise menos objetiva. Em 2024, a corte alterou a Resolução 23.610/2019, sobre propaganda eleitoral, para incluir o parágrafo único do artigo 3º-A.
O dispositivo diz que “o pedido explícito de voto não se limita ao uso da locução ‘vote em’, podendo ser inferido de termos e expressões que transmitam o mesmo conteúdo”.
Liberdade de expressão
Esse embaralhamento de critérios pode ser desfeito pelo voto divergente do ministro Antonio Carlos Ferreira. Para ele, o legislador teve como objetivo garantir maiores liberdades para quem discute temas e propostas políticas no período de propaganda vedada.
Assim, as postagens divulgadas por Júlio de Marcos Santana estariam todas abarcadas pelas possibilidades da lei. O voto foi por julgar improcedente a representação, afastando a multa.
“Compreendo a preocupação com possibilidade de desvirtuamento do período que antecede a campanha. No entanto, não se pode interpretar extensivamente restrições legais de modo a inviabilizar manifestações autorizadas pelo legislador”, defendeu ele.
O ministro propôs ainda um método para analisar o tema. Primeiro, deve-se verificar se a manifestação contestada se enquadra nas exceções estabelecidas pelo legislador como permitidas na pré-campanha.
Apenas depois disso caberia a análise da presença de expressões semanticamente equivalentes ao pedido explícito. Para Ferreira, isso preserva a intenção legislativa de ampliar a liberdade de expressão e dá segurança jurídica aos participantes do processo eleitoral.
Magia identificada
O ministro Floriano de Azevedo Marques não chegou a votar no mérito, mas já adiantou que diverge de Ferreira. Para ele, a jurisprudência aplicada ao caso visa impedir que o pré-candidato contorne a proibição e antecipe o início do processo eleitoral, fazendo uma espécie de publicidade disfarçada.
“Quando alguém vai a um evento e posta dizendo que ‘tem mais trabalho vindo aí’ ou que ‘estamos assinando ordens’ e que ‘continuaremos fazendo’, está claramente se colocando na condição de candidato e dizendo: ‘Estou aqui, se comprometam com o meu trabalho’.”
A ministra Cármen Lúcia, que pediu vista, destacou ainda que o TSE não construiu sua jurisprudência restringindo a liberdade de expressão no período da pré-campanha.
“Pelo contrário, o testemunho que o TSE tem dado é de garantia da liberdade de expressão, o que não significa abuso da expressão como forma de desguarnecer direitos, inclusive dos eleitores, e a paridade entre os candidatos.”